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A ilusão das bolhas da internet


A OLX SOBRAL tem 57,8 mil membros, não restritos a Sobral, alcançando, na verdade, toda a região norte do estado do Ceará. Ao longo de um mês de inserção neste grupo e de quase 30 postagens, a interação variou de 3 a 100 comentários por postagem. A maioria dessa interação foi, no entanto, bolsonarista. Isso construiu, para alguns membros, a ilusão de que Bolsonaro é maioria absoluta no grupo. Será?! No auge do bolsonarismo (as eleições 2018), Bolsonaro teve apenas 33,14% dos votos em Sobral. No Ceará, essa taxa foi ainda menor, 28,89% Hoje, depois de todos os escândalos noticiados, depois do desgaste com a CPI da COVID e o caso das vacinas superfaturadas, quanto resta dessa porcentagem? Este é o segundo texto da série "Uma estação no inferno", sobre a experiência de inserção num espaço digital dominado por bolsonaristas.



A OLX SOBRAL tem 57,8 mil membros, não restritos a Sobral, alcançando, na verdade, toda a região norte do estado do Ceará. Um mês de inserção em grupos como esse podem render algum tempo de pesquisa comportamental.


Nas aproximadamente trinta postagens que fiz, ao longo de um mês de inserção no grupo, entre memes, textos curtos, textos longos e vídeos, a interação foi muito variada. Dependendo do conteúdo (às vezes, um mais sério, às vezes, uma denúncia contra Bolsonaro, às vezes uma charge, um meme etc.), há postagens com mais de cem comentários, mas há também postagens com 3 comentários. A maioria destes comentários, de fato, é a favor do governo. E esse ponto é bem interessante de ser analisado. Por quê?


O fato do maior número de interações nas postagens ter sido de bolsonaristas construiu, para alguns membros, a ilusão de que o grupo é de maioria absoluta pró-governista. Alguns chegavam a comentar que eu estava passando vergonha pelo número de reações negativas às postagens e que fosse "procurar minha turma". Dois ou três membros do grupo chegaram a me procurar no privado a fim de saber se eu "estava bem da cabeça", outros chegaram a comentar isso nas postagens. Alguns chegaram a pedir, no privado, que eu me retirasse do grupo, para o bem da minha saúde mental, já que, ali, "todo mundo era bolsonarista". Alguns extrapolavam essa compreensão crendo que essa pretensa maioria de bolsonaristas no grupo reverbera uma condição nacional: a de que Bolsonaro ganhará as eleições de 2022 no 1º turno. Será?!


Houve comentaristas (vou chamar assim) que se repetiam nas postagens e, na maioria das vezes, era entre estes poucos que eu filtrava alguma interlocução que, naquele momento, eu julgava mais frutífera, no sentido de tentar identificar o grau de informação que aquele comentarista tinha/tem. Isso acabou aumentando o número de comentários em algumas postagens. Há interlocuções com mais de 20 turnos de conversa. Dos 20 mais assíduos comentaristas, com apenas 6 consegui desenvolver esse diálogo mais longo. É uma porcentagem muito pequena diante do total de membros do grupo. Pequena, porém, barulhenta.


Uma pesquisa mais apurada poderia averiguar se isso tem a ver com o comportamento dos não-eleitores de Bolsonaro no grupo. A OLX Sobral é um grupo de vendas, não de política. Não raro, um ou outro comentarista cobrava que o administrador do grupo tomasse alguma providência para barrar postagens políticas no grupo. Outro, questionava o tempo que eu dedicava para a interação e as postagens. Dessa forma, uma pergunta: é possível considerar que é do perfil comportamental dos não-eleitores de Bolsonaro respeitar mais as regras do grupo (e do jogo)? Isso pode ser ampliado para uma série de elementos do comportamento cotidiano e também de toda a organização política e social do país. Pequenas corrupções como não devolver o troco errado, ultrapassar o sinal vermelho ou amarelo, não parar para o pedestre na faixa, furar filas etc. são comportamentos mais típicos de que perfil? E quanto às regras mais coletivas, como as regras do jogo democrático? A não-aceitação do resultado de quatro eleições presidenciais vencidas pela Esquerda (de 2002 a 2014) foi o que levou a Direita a arquitetar o que hoje já é lugar comum na análise histórico e da ciência política: o golpe do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016.


Seria necessário, para responder a estas perguntas e confirmar (ou não) hipóteses, uma pesquisa muito mais amplas. Mesmo com o recorte de realizá-lo no grupo OLX Sobral (e a partir da interação com as minhas postagens) seria necessário, primeiro, descobrir qual o perfil político dos mais de 57 mil membros do grupo; descobrir quantos destes visualizaram as postagens e, mais ainda, entrevistá-los no sentido de descobrir por que não interagiram. Isso poderia responder à questão sobre se o grupo OLX Sobral é um grupo predominantemente bolsonarista ou não. Nesta pesquisa espontânea e independente, não houve tempo nem recurso para me dedicar à identificação destes perfis. Mas há outros dados disponíveis fora do grupo que podem apontar em alguma direção.


No auge do bolsonarismo, ou seja, nas eleições de 2018, Bolsonaro teve 33,14% dos votos em Sobral (1). No Ceará, essa taxa foi ainda menor, 28,89% (2). A OLX Sobral, como disse no começo, tem 57,8 mil membros, dos quais, incluindo tanto os pró quanto os anti-governo, aproximadamente 100 interagiram assídua ou esporadicamente com minhas postagens. Como a maioria dos comentários era de bolsonaristas (ainda que se resumissem a xingar, postar memes, postar "KKKKKK", ou a repetir frases de efeito como "BolsonaroReeleito", "Bolsonaro2022"), isso construiu a ilusão de que a maioria do grupo é bolsonarista. Mas, a julgar pelo resultado das eleições de 2018, o auge do bolsonarismo, isso está longe de ser verdade.


Pesquisa realizada no início de julho de 2021 pelo CNT/MDA mostra que a aprovação do atual presidente caiu de 43,5% de fevereiro para 33,8% em julho. Sua reprovação, no entanto, subiu para 62,5% (3)


Ou seja, Bolsonaro está, de fato, derretendo.



Léo Mackellene é doutorando em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mestre em “Literatura e Práticas sociais” pela Universidade de Brasília (UnB). Professor de Argumentação jurídica no curso de Direito e Editor-chefe de Publicações Acadêmicas da Faculdade Luciano Feijão (FLF), em Sobral-CE. Escritor membro da Academia de Letras e Artes do Nordeste (ALANE). Autor de dez livros, dentre eles o romance Como gota de óleo na superfície da água (Radiadora, 2017). E-mail: leomackellene@gmail.com



 



 

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